A empresa finlandesa Nokia, lembrada pelos celulares “tijolões e indestrutíveis” da década de 2000, está concentrada na implantação da tecnologia 5 G ao redor do mundo e em breve também no Brasil. O fornecimento de redes e antenas para a tecnologia é o principal negócio da empresa. O executivo-chefe da empresa no Brasil, Ailton Santos, projeta uma injeção de US$ 1,5 trilhão à economia brasileira em 15 anos a partir do 5G.
Para ele, apesar de não haver data para o leilão, o país continua dentro de um prazo sadio para ativar o 5G, na sua avaliação, mas não pode descumprir o edital da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
Liderança global
Com 165 contratos já fechados, a Nokia disputa a liderança global do mercado de equipamentos com a sueca Ericsson, que tem 139, e a chinesa Huawei, com 92 – no caso da Huawei, o dado é do fim de 2019, pois a empresa deixou de atualizar o número depois que sofreu restrições em diversos países, como Estados Unidos e Reino Unido.
Em paralelo, a Nokia tem o desafio de aumentar a eficiência. Em março, a matriz determinou que suas filiais cortem entre 5 mil e 10 mil postos de trabalho até 2023, para economizar até 700 milhões de euros.
Por aqui, a determinação terá pouco impacto, pois as operações já são enxutas, afirma o executivo-chefe da empresa no Brasil, Ailton Santos, em entrevista ao Estadão/Broadcast.
A Nokia tem escritórios em São Paulo, Rio e Curitiba, além de hubs em Sorocaba e Barueri (SP) para produção e distribuição de equipamentos. Emprega 3 mil pessoas direta e indiretamente.
A reestruturação é positiva para a Nokia como um todo. Não vejo como uma simples redução de pessoas, mas sim como uma reorganização para sermos mais eficientes e atender melhor tanto clientes quanto acionistas. No Brasil, o impacto é mínimo, pois já vínhamos fazendo o trabalho de forma enxuta.
Quantos contratos de 5G a Nokia tem?
Temos por volta de 165 contratos globais. Fornecemos para as maiores operadoras do mundo. Atendemos às quatro maiores nos Estados Unidos, às três maiores da Coreia do Sul e do Japão, acabamos de ganhar um contrato na Suécia. Somos os líderes mundiais em patentes essenciais no 5G, com mais de 3.500 registros.
Há contratos no Brasil?
No Brasil não temos contratos de 5G, até porque ainda não tivemos o leilão. Mas estamos na América Latina, como Antel Uruguay, Star Aruba, CNT Ecuador e Telecom Argentina.
Qual será o efeito 5G para a economia?
Em um estudo da Nokia com a Omdia sobre o impacto do 5G no Brasil nos próximos 15 anos, a conclusão é que veremos um ganho de produtividade de US$ 1,5 trilhão. Isso equivale a 1% (de ganho) no PIB brasileiro por ano daqui para frente.
Tem um exemplo de como veremos esse bolo crescer?
Imagine uma fazenda que tem precisão em todas as mediações dos seus insumos e processos. Com 5G, ela será super produtiva no uso de sementes, fertilizantes, água etc. Esses ganhos de produtividade vão se somando até o consumo pelas pessoas físicas. O efeito disso sobre toda a cadeia produtiva fará com que países que demorem muito a adotar o 5G comecem a perder competitividade interna e externa. Isso porque o desenvolvimento das aplicações para melhorar a produtividade só será possível a partir da disponibilidade da infraestrutura. Portanto, o tempo é fundamental.
O Brasil está atrasado na realização do leilão do 5G?
Não acho que estamos atrasados. Ainda estamos em um timing bom, desde que a gente consiga cumprir minimamente os prazos previstos na implementação da infraestrutura.
Qual é a sua expectativa de prazos para o leilão do 5G?
São variáveis que não controlamos. Para não ficarmos parados, desenvolvemos parcerias para testes de uso do 5G. Temos laboratórios em São Paulo e Curitiba, parcerias com universidades, centros de pesquisa e Sebrae, entre outros. Estamos formando pessoal e desenvolvendo aplicações. A ideia é ganhar tempo.
Que tipos de experimentos em 5G a Nokia tem feito?
Fizemos uma demonstração recente para o governo federal e para o Congresso, em Brasília, com foco na telemedicina. Este será um dos primeiros setores a adotar o 5G. Montamos um mini hospital com robôs fazendo entrega de remédios e descarte de lixo tóxico, mostramos a possibilidade de telemetria real de UTI, uso de holograma para cirurgia a distância ou treinamento de estudantes.
O senhor considera acertada a exigência da Anatel do padrão standalone, isto é, uma rede inteiramente de nova geração?
Faz sentido. Como o standalone oferece menor latência, atende a um novo segmento de indústrias que não poderiam ser endereçadas de outra forma (pois precisam de respostas rápidas, como carros autônomos ou cirurgias por robôs). Para o consumidor final, não é tão importante, a não ser em casos como o setor de games.
Como o senhor avalia a restrição à Huawei nos EUA?
Muitos países, ao discutir o 5G, não tocam apenas no contexto dos equipamentos, mas também em accountability (responsabilização). Nós somos uma empresa listada na bolsa, o que permite responsabilização na questão societária. Temos sede em país democrático, com Poderes livres, que são instrumentos de responsabilização.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.